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Proporcionalidade e Razoabilidade nas Custas Processuais em Casos de Extinção por Litispendência

O acesso à justiça é um direito fundamental assegurado pela Constituição, visando garantir a todos os cidadãos a possibilidade de buscar a tutela jurisdicional para a proteção de seus direitos. No entanto, em muitas ocasiões, a questão das custas processuais pode se tornar um obstáculo para a efetivação desse direito. 

Um dos desafios enfrentados no âmbito jurídico e muito pouco tratado é a questão das custas processuais em casos de processos extintos por litispendência. A litispendência ocorre quando existe outro processo idêntico em andamento, e por isso, o novo processo é extinto. Entretanto, mesmo diante dessa extinção, muitas vezes as partes são condenadas ao pagamento de custas processuais. 

A cobrança de custas processuais em casos de extinção por litispendência levanta questionamentos importantes sobre a proporcionalidade e razoabilidade dessa medida. Afinal, como é justo cobrar custas por vezes em valores exorbitantes de uma pessoa sem apresentar a contrapartida, sem a prestação jurisdicional? Isso não acaba por punir o indivíduo por exercer seu direito de acesso à justiça? 

É injusto que uma pessoa deva pagar o mesmo valor de custas processuais num processo extinto, sem tramitação, que num processo que culminou numa sentença com julgamento de mérito, vez que um teve muitos mais andamentos e demandou muito mais do judiciário que um processo que foi extinto logo de início. Evidente que o processo extinto sem julgamento do mérito gera menos onerosidade ao judiciário, e por consequência as custas devem ser proporcionais.

Para embasar essa discussão, é válido analisar situações análogas em outros contextos jurídicos. Por exemplo, em ações litigiosas que em conciliação/mediação obteve-se êxito num acordo, as custas são reduzidas; isto acontece em virtude do Código de Processo Civil 2015 ter uma natureza consensual, mas também porque é considerando a menor complexidade do processo, e a menor quantidade de atos que serão praticados pelo judiciário. Isso indica que a relação entre a quantidade de trabalho demandado pelo judiciário e o valor das custas deve ser proporcional.

A jurisprudência tem sido sensível a essa questão, como exemplificado por decisões como a do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que considerou a ausência de angularização processual como fator determinante para afastar a obrigação do pagamento das taxas judiciais. Essa abordagem busca evitar o ônus excessivo sobre as partes envolvidas.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL, COM A CONDENAÇÃO DA DEMANDANTE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. RECORRENTE QUE OBJETIVA O AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS, DIANTE DO EXPRESSO PEDIDO DE CANCELAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO. ACOLHIMENTO DA TESE. INTELIGÊNCIA DO ART. 290 DO CPC. PROVIDÊNCIA REQUERIDA ANTES DA ANGULARIZAÇÃO PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL QUE AFASTA A OBRIGAÇÃO REFERENTE AO RECOLHIMENTO DAS TAXAS JUDICIAIS. SENTENÇA ALTERADA NO PONTO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5080387-67.2021.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. Thu Aug 04 00:00:00 GMT-03:00 2022). (TJ-SC - APL: 50803876720218240023, Relator: Osmar Nunes Júnior, Data de Julgamento: 04/08/2022, Sétima Câmara de Direito Civil) (grifo nosso) 

A imposição de custas processuais em casos de extinção por litispendência deve considerar as particularidades do caso concreto. A análise do juízo deve ir além da aplicação literal das normas, buscando a harmonização entre o direito e a justiça, conforme previsto no Código de Processo Civil. 

Em que pese o assunto seja custas processuais, uma analogia a decisão do TRT12 que trata de honorários advocatícios sucumbenciais é importante:

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. A processualística do trabalho, após a edição da Lei nº 13.467/2017, impõe o pagamento de honorários advocatícios em caso de sucumbência (art. 791-A da CLT). Em se tratando de extinção do feito sem julgamento do mérito, por acolhimento da preliminar de litispendência, não há falar em sucumbência ou proveito econômica, motivo pelo qual não são devidos os honorários advocatícios, não sendo o caso de aplicação subsidiária do art. 90 do CPC, em razão da existência de regramento trabalhista próprio. Recurso do reclamante conhecido e provido. (TRT-11 00013902620185110007, Relator: ADILSON MACIEL DANTAS, 2ª Turma)

Nesse caso, não foi devido honorários advocatícios em virtude da ausência de proveito econômico ou sucumbência, também não foi devido porque o advogado do Requerido não trabalhou. Aqui não é o mesmo? A única mudança é que a divergência é acerca das custas processuais. O processo foi extinto por litispendência, não teve proveito econômico e os servidores que trabalhariam caso o processo seguisse não irão trabalhar, então por qual razão fixar custas considerando como se todos tivessem trabalhado?

Não estaria o judiciário enriquecendo sem causa numa situação em que a tutela jurisdicional não foi entregue e as custas cobradas?

É inegável que as custas processuais têm uma função importante na manutenção do sistema judiciário. No entanto, a aplicação indiscriminada dessas custas em casos de extinção por litispendência pode ferir princípios fundamentais do direito, como o acesso à justiça e a proporcionalidade. Portanto, é essencial que o sistema jurídico busque formas de assegurar que a cobrança de custas reflita a realidade das demandas e não onere indevidamente as partes envolvidas.

A questão das custas processuais em casos de extinção por litispendência não deve ser tratada de forma simplista. É fundamental que o sistema judiciário busque um equilíbrio entre a necessidade de manutenção do sistema e o respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos. A proporcionalidade e razoabilidade na aplicação das custas processuais são pilares essenciais para assegurar o acesso à justiça de forma justa e equitativa. Qualquer análise superficial do tema fere de morte princípios da isonomia, inafastabilidade da jurisdição, acesso à justiça, solidariedade social e direito social à assistência jurídica gratuita






Melissa Azevedo é Advogada, inscrita na OAB/SC sob o nº 45.255, especialista em Direito das Famílias, Sucessões e Imobiliário. 





Referências: 

Decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Apelação n. 5080387-67.2021.8.24.0023, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. Thu Aug 04 00:00:00 GMT-03:00 2022.

Acórdão 1358024, 07186808820218070000, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 22/7/2021, publicado no DJE: 3/8/2021.

Decisão do TRT-11 00013902620185110007, Relator: ADILSON MACIEL DANTAS, 2ª Turma.

LEI Nº 17.654, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2018.

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